Proposta foi aprovada em 2º turno por 66 a 2 pela Assembleia de MG
A Assembleia Legislativa de Minas Gerais aprovou hoje (12), em segundo turno, a Proposta de Emenda à Constituição do Estado (PEC) 68/2021 com o objetivo de viabilizar o uso de recursos da mineradora Vale por 853 municípios mineiros. Cada um ficará com a fatia proporcional à sua população, de um total de R$ 1,5 bilhão extraído dos R$ 37,68 bilhões previstos no acordo de reparação da tragédia de Brumadinho.
A forma de repasse dos recursos chegou a gerar um desentendimento entre executivo e legislativo. O governo mineiro queria celebrar convênios com os municípios para projetos específicos, que seriam realizados em parceria, o que permitiria um acompanhamento do investimento pelo estado.
A maioria dos partidos com representação na Assembleia, no entanto, costurou um entendimento para garantir que os recursos fossem repassados diretamente para as contas das prefeituras. Eles avaliaram que o cenário de pandemia e a crise econômica demandam um processo mais célere e desburocratizado, que dê aos municípios autonomia na aplicação da verba em obras prioritárias e ações de enfrentamento à covid-19, de estímulo à agricultura familiar e de assistência social.
O impasse foi superado em reunião, na semana passada, na qual o presidente da Assembleia Legislativa, Agostinho Patrus, recebeu a secretária de Planejamento e Gestão de Minas Gerais, Luísa Barreto, e o advogado-geral do Estado, Sérgio Pessoa de Paula Castro, além de representantes do Ministério Público de Minas Gerais (MPMG), do Ministério Público Federal (MPF) e da Defensoria Pública do estado. Foi construído um consenso que levou a alguns ajustes no texto da PEC que havia sido aprovado em primeiro turno.
Dispositivos
A redação da PEC 68/2021 aprovada em primeiro turno já dava formatação constitucional para as transferências de recursos do estado para municípios, autorizadas por meio de lei de abertura de crédito adicional.
Após o consenso entre Executivo e Legislativo, foram incluídos outros dispositivos, que buscam contornar preocupações levantadas pelo governo mineiro sobre o controle e a fiscalização dos investimentos no âmbito municipal. Outra questão diz respeito à responsabilização: o executivo estadual temia responder legalmente caso houvesse mal uso dos recursos pelas prefeituras.
Um dos novos dispositivos estabelece que as leis que aprovam a abertura de crédito adicional e a transferência aos municípios devem delimitar os projetos passíveis de receber os investimentos, bem como procedimentos e condições que precisam ser observados. Outro dispositivo define que a aplicação dos recursos é de exclusiva responsabilidade da prefeitura, que deverá prestar contas ao Tribunal de Contas do Estado (TCE), o qual emitirá relatório.
A PEC foi aprovada em segundo turno por 66 a 2, superando os dois terços de votos necessários. A Assembleia Legislativa é composta por 77 deputados. Era preciso ao menos 52 voto para a aprovação. No primeiro turno, a diferença foi similar: 63 a 3. Com a aprovação em segundo turno, a PEC deverá ser promulgada pelo presidente da assembleia em cinco dias úteis.
Acordo
A tragédia de Brumadinho ocorreu em 25 de janeiro de 2019, com o rompimento de uma barragem da Vale. Uma avalanche de rejeitos liberada no meio ambiente causou 270 mortes, além de ter promovido destruição de comunidades e devastação ambiental.
O termo de reparação entre a mineradora e o governo de Minas Gerais foi celebrado em fevereiro deste ano, pouco mais de de dois anos após o episódio. O MPMG, o MPF e a Defensoria Pública também participaram de acordo.
Ficou acertado que R$ 37,68 bilhões devem ser destinados a medidas de caráter reparatório e compensatório. O montante diz respeito apenas à indenização de danos coletivos. As indenizações individuais e trabalhistas que deverão ser pagas aos atingidos estão sendo discutidas em outros processos judiciais e extrajudiciais.
No acordo, foram previstos diversos projetos que incluem programas para transferência de renda e atendimento de demandas comunitárias, investimentos socioeconômicos, ações de recuperação socioambiental, medidas para garantir a segurança hídrica, melhorias dos serviços públicos e obras de mobilidade urbana, entre outras.
Algumas das ações serão desenvolvidas diretamente pela Vale. Em outras obras, caberá à Vale apenas disponibilizar os recursos para implementação pelo Executivo ou para definição dos atingidos em conjunto com o MPMG, o MPF e a Defensoria Pública estadual.
A parte dos 37,68 bilhões que deve ser repassada ao governo mineiro corresponde à R$ 11,06 bilhões. É desse montante que sairá R$ 1,5 bilhão que será repartido entre os 853 municípios. Também foram previstas algumas obras estruturais no estado como medida compensatório pela tragédia.
A principal delas é o financiamento do início da construção do Rodoanel, que contornará a região metropolitana de Belo Horizonte e ligará as rodovias federais BR-040, BR-381 e BR-262. Para essa obra, foram reservados R$ 3,5 bilhões. O acordo inclui também construção de pontes, recuperação de estradas, ampliação do metrô de Belo Horizonte e conclusão de hospitais.
Autorização
A movimentação dos R$ 11,06 bilhões, no entanto, depende de autorização da Assembleia, em função de dois dispositivos legais. O artigo 161º da Constituição do Estado estabelece a necessidade de autorização legislativa para suplementação do orçamento do estado em caso de recurso extraordinário que supere 1% da receita orçamentária total.
Já o artigo 17 da Lei Estadual 23.751/2020, que estimou as receitas e fixou as despesas do estado para o exercício de 2021, diz que o uso de recursos provenientes de acordos relativos à tragédia de Brumadinho precisa ser aprovado pelos parlamentares.
Para obter essa autorização, o Projeto de Lei (PL) 2.508/2021 foi elaborado e enviado à Assembleia pelo governador Romeu Zema. Os deputados ainda discutem alterações nas medidas previstas.
Em discursos no plenário, parlamentares defenderam a substituição de alguns projetos que não consideram prioridade no momento, como a construção de pistas de skate e a troca da fiação elétrica da Cidade Administrativa, sede do governo estadual. Houve inclusive um primeiro consenso com o governo mineiro para garantir a destinação de verba à pesquisa da Spintec, vacina contra a covid-19 que está sendo desenvolvida pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).
O desentendimento em torno da forma de repasse do R$1,5 bilhão aos municípios surgiu justamente no âmbito da tramitação do PL 2.508/2021. O governo considerou que o procedimento desejado pelos deputados feria a constituição estadual. O consenso alcançado entre o Legislativo e o Executivo, seguido da aprovação da PEC 68/2021, abre caminho para destravar a tramitação do PL 2.508/2021.
O projeto encontra-se atualmente aguardando parecer da Comissão de Fiscalização Financeira e Orçamentária. Entre os itens que devem ser incluídos no parecer, está a delimitação dos projetos que poderão ser desenvolvidos pelas prefeituras.
O MPMG irá sugerir proibições para uso do dinheiro. Outra decisão que pode ser tomada pelos parlamentares envolve a fixação de um piso mínimo para que municípios com população pequena não recebam quantias irrisórias. Ainda não há previsão para a apreciação no plenário, o que deverá acontecer em turno único.
Agência Brasil